1) O Ordenamento Jurídico
Neste texto, pretende-se investigar o modo de
escolher a norma legal aplicável ao caso concreto, mas que não sofra a rejeição do ordenamento
jurídico e por sua vez se tornando inútil. Então partiremos da percepção de que
temos em mente a Norma Fundamental (Constituição elaborada por poder constituinte originário) como termo unificador das normas que compõem
o ordenamento jurídico. O problema do ordenamento jurídico é a composição de
suas partes, ou seja, as regras gerais, especiais e/ou extravagantes, na
adequação delas no tempo, espaço e matéria. Assim, quando totalizamos essas regras,
elas se constituem numa síntese, isto é, uma unidade, mas tal como substâncias
também podem ser decompostas, podendo produzir substratos positivos ou negativos. Todavia, sendo a composição um arranjo ou combinação, muitas vezes
não significa que resulte na ordenação dos elementos, podendo ocorrer
antíteses, conflitos ou paradoxos de normas diante da efetiva aplicação. Assim sendo, como uma regra aceita no meio jurídico tem-se como pressuposto de que
as leis não podem se estabelecer no ordenamento em antítese ou antagonismos,
sob pena delas deporem contra o próprio ordenamento.
No entanto, se o ordenamento constitui um
sistema, indo do simples ao complexo, as contradições podem ser resolvidas
através de eliminação ou adequação dos elementos antagônicos ou aparentemente
em conflitos. Dessa adequação, resultará ou gerará uma espécie de
substância/síntese de justiça, ligando o ordenamento ao resultado, determinando
a resolução ou não do conflito posto sob o cuidado normativo escorreito dos
referidos vícios.
Como dito, essa substância jurídica ordenada
constitui uma unidade, em que pese ser formado por elementos que isoladamente
são indivisíveis, integrando sem perder as propriedades jurídicas
especializadas. Portanto, essas regras devem estar conexas no ordenamento.
Citaremos, abaixo, exemplo extremado de conflito insolúvel e de conseqüente
exclusão da regra do ordenamento jurídico: Imaginamos um código que estabeleça
minuciosamente os procedimentos formais e materiais para aplicação da pena de
morte cujo paradigma encontrou no direito comparado americano a mais sólida
justificação doutrinária. Evidentemente que tal regra estaria em conflito com
nossa Constituição, pois aqui não adotamos a pena de morte. Assim estaria
contrária à Constituição e excluiríamos sua aplicação, pois não se formaria
qualquer substancia jurídica aprazível na composição da justiça. Mas tal
exemplo serve de alerta, pois aqui no meio jurídico, em diversos temas, alguns
doutrinadores e julgadores desavisados procuram trazer o direito comparado para
dentro das questões judiciais do direito brasileiro, mas isso pode se fazer equivocadamente sem o menor
cuidado com a possibilidade da rejeição total ou parcial de elemento antagônico
incorporado e pretensamente introduzido no ordenamento jurídico, se tornando
indevida a inovação.
Toda a disfunção desses elementos/regras merece
análise pelos Operadores do Direito, objetivando a resolução de conflitos
normativos para restabelecer a síntese. Sugere-se, como solução possível,
pensar numa ordem estrutural, ao começar pelo monista/positivista, com enfoque
na neutralidade e objetividade científica do direito. Logicamente, no sentido
de compatibilizar ou rejeitar a regra analisada pela conformação desta com a
norma fundamental, considerando ainda o lado da validade, isto é, uma visão
Kelseniana. Ou ainda nos fundamentos funcionais do direito, verificando as
contradições, lacunas, vazio, completude, ou quiçá, no pluralismo de ordens
parciais, localizando e ordenando as normas, percebendo o conceito promocional
delas em prol do direito de conquistas positivas do povo, num jogo democrático
de respeito às regras, em se falando de uma visão bobbiana, e de outros
similares pensadores.
2) Do simples ao Complexo - e casos objetivamente claros.
Vale ressaltar que o Poder Originário, descrito
como Norma Fundamental (ou simplesmente a constituição elaborada por um poder constituinte originário ou derivado), é o pressuposto de um ordenamento simples, “Chamamos esse poder originário de fonte das
fontes. Se todas as normas derivassem diretamente do poder originário,
encontrar-nos-íamos frente a um ordenamento simples.” (NB TOJ – 41). Mas no
Brasil existe ordenamento simples?! É prudente que se responda sim, pois em
regra é aquele em que já pode ser executado obedecendo diretamente o comando da
Constituição, sem necessitar de regulamentação. Exemplifico (para mim mesmo) -
Imaginamos a fixação do teto remuneratório constitucional, art. 37, XI e XII.
Tal regra decorre diretamente da Constituição, nesse caso a norma fundamental
não necessita que a pirâmide tenha vários andares de ordenamento, ou seja, de
leis que regulamentem a Constituição em sede de produção legislativa, pois o
seu comando já emana ou decorre diretamente dessa fonte primária/originária.
Chamaríamos então de auto-aplacável – portanto, o regramento no caso citado, é
direto, de modo que verificamos estar diante de um ordenamento simples e
diretamente exequível. Disso decorre que nenhuma outra norma/regra/regulamento
ou decisão pode ser inserida entre a constituição e o caso jurídico para
justificar ou criar fatores de complexidade da matéria. Ocorre que o tema se
encontra na órbita de comando simples da constituição no que se refere ao fato
de os servidores não poderem auferir uma remuneração superior ao teto. Nem as
decisões judiciais podem ser permissivas, uma vez que não possuem validade, nem
legitimidade de autoridade, pois o poder constituinte não delegou a ninguém
qualquer produção legislativa ou atos de execução que transcendam o texto
originário! Assim, aqueles que querem usufruir de benefícios e penduricalhos
superiores ao teto enveredam, indevidamente, para a complexidade do sistema,
contudo sem qualquer razão, pois há momentos em que a Constituição determina o
simples e não o complexo. Nesse caso “a Constituição encerra a fase poder dever
na sua própria estrutura, comandando apenas a execução, não permitindo a
produção.” Outro sistema simples pode ser visto no art. 39 da CRFB em que a
Constituição Federal também ordena uma simples execução, ou seja, que se faça
uma Lei dentro dos parâmetros já estabelecidos. Logicamente, o tema autorizado
dever ser esgotada na primeira produção legislativa, imediatamente no primeiro
andar/degrau da pirâmide de produção normativa. No entanto, o que se observa
hoje nos portais de transparência, é o fato de a remuneração de determinados
servidores cuja responsabilidade e complexidades das atribuições são de meios
ou de rotinas administrativas, mas que possuem ganhos muito além do
proporcional às responsabilidades funcionais e profissionais, porém, outros
servidores de órgãos diferentes, mas com tarefas similares e de mesma natureza
recebendo remuneração bem aquém. O exemplo típico também ocorre nas funções
essenciais à Justiça, entre as carreiras jurídicas, numa verdadeira disfunção
remuneratória e estrutural abusiva. A resposta deveria ser dada pelo legislador
em arrumar as disfunções constitucionais para equilibrar o direito e Justiça.
Retornando ao tema. Notamos que a complexidade
do ordenamento decorre da constatação de que as normas afluem de diversos
canais, em especial da nascente sociedade civil em que nela vigem normas de
todos os gêneros, religiosas, morais, sociais, contratuais/convencionais... Por
outro lado, o poder originário necessita estar atualizado, havendo então uma
multiplicação de fontes, que o próprio poder originário concede e se
auto-limita, subtraindo de si próprio parte do poder soberano normativo,
criando um plexo de autorizações, seja de conteúdo formal, material e de atores
competentes para editar normas.E a mais sabia forma de se atualizar a
constituição deriva da autorização para emendar a constituição - as emendas
constitucionais de um poder constituinte derivado.
3) A Substância da Justiça
Portanto, o Operador do Direito deve estar
atento à complexidade do ordenamento jurídico. Observar a existência de regras
jurídicas precedentes ao poder constituinte, em que a recepção deve ser
observada cuidadosamente, assim como as delegações de poder de produção
legislativa. Cuidar se os costumes têm comportamento uniforme e duradouro,
enquanto produto ou substância natural. As conexões integrativas entre as normas
genéricas e específicas, respeitando a autonomia privada como fonte de
interesses que devem integrar o ordenamento estatal. Somente assim “o
ordenamento jurídico produzirá a substância normativa capaz de
alimentar/materializar a Justiça”. Falo de uma justiça geral, de Estado, não
apenas na circunscrição do judiciário. E todo aquele que exercer o ofício
jurídico tem o dever primário de preservar e exercitar o ordenamento jurídico,
resolvendo as antinomias e conflitos de normas, para “que a justiça seja feita
preferencialmente dentro do próprio ordenamento jurídico, rejeitando qualquer
outra forma de justiça autocrática, despótica ou baseada em direito
extraterritorial inapropriado”, evitando o mero ato de autoridade exercido fora
do âmbito do Estado Democrático de Direito.
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira
Usando o trocadilho, o assunto diz respeito ao desrespeito a Constituição Federal. Falo do ordenamento jurídico e exaltei as formas tradicionais de conectar o sistema normativo. Como se fosse uma malha de vias urbanas, mas de leis, ou seja, pode haver várias vias para se chegar ao local desejado ou do resultado pretendido. O que não pode é passar por cima das casas e prédios, como alguns fazem com a Constituição. Inventam desvios quando ela indica claramente por aonde ir ou o que se deve fazer de modo simples. Por exemplo, quando se fixa o teto constitucional, cujo cumprimento de ordenação é primário diretamente da Constituição, ficam criando caminhos vicinais para esconder malas de dinheiros em remunerações e benefícios, constitucionalmente indevidos!
ResponderExcluirPortanto, discorro sobre as formas de interpretação no âmbito do ordenamento jurídico, como qualquer acadêmico é capaz de fazer melhor. Mas o problema é de aplicação, uma questão de moral, ética, vocação e civismo!
Chamaríamos então de auto-aplacável – portanto, o regramento no caso citado, é direto, de modo que verificamos estar diante de um ordenamento simples e diretamente exequível. Disso decorre que nenhuma outra norma/regra/regulamento ou decisão pode ser inserida entre a constituição e o caso jurídico para justificar ou criar fatores de complexidade da matéria. Ocorre que o tema se encontra na órbita de comando simples da constituição no que se refere ao fato de os servidores não poderem auferir uma remuneração superior ao teto. Nem as decisões judiciais podem ser permissivas, uma vez que não possuem validade, nem legitimidade de autoridade, pois o poder constituinte não delegou a ninguém qualquer produção legislativa ou atos de execução que transcendam o texto originário! Assim, aqueles que querem usufruir de benefícios e penduricalhos superiores ao teto enveredam, indevidamente, para a complexidade do sistema, contudo sem qualquer razão, pois há momentos em que a Constituição determina o simples e não o complexo.
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