Já
mencionei em outros textos que a matéria é corruptível. Então o Estado Puro é o
composto pelas idéias – um Estado ideal de ordem e lei. Já o Estado Corruptível, temos que seja aquele que adentra no mundo material ou substancial, intervindo,
distribuindo direitos, bens e serviços na ordem substancial das coisas e, como
mencionei, as coisas são por natureza corruptíveis, sendo o mundo das idéias
perfeito pois as coisas da alma assim as são.
O
que é o Estado e sua origem? Aqui neste texto não é possível alongar ou
descrever, senão dizer que o conceito de Estado sofreu evolução, desde uma visão jusnaturalista, da concepção
aristotélica - como um fato natural, sendo um prosseguimento natural da
família... Seja ainda por acordo, nas teorias contratualista do estado de
natureza, ou eudemonista que procura a felicidade em vez da liberdade...
Porém, inicio com Platão com seu Estado Puro de
Ordem e Lei.
Mas o que seria de nós sem um Estado, estaríamos
em luta ou num verdadeiro amor entre o individuo e a sociedade?!
Imagino que estaríamos num dos seguintes pólos, isolados ou em sociedade, autossuficientes ou não respectivamente. Se insuficientes com mais razão resta viver em sociedade e neste caso o indivíduo e sociedade seriam
interdependentes.
Mas a igualdade na sociedade poderia se degenerar,
uma vez que Platão na sua passagem sobre o naturalismo biológico descreveu
determinado antagonismo: “Deus fez livres
todos os homens; nenhum homem é escravo por natureza”. Contudo, na sua
teoria da desigualdade biológica e moral aduziu que os Gregos e Bárbaros são
desiguais por natureza: Concluindo que a vida
começa com a desigualdade natural e deve continuar sobre esse alicerce, sendo a
razão de viverem em sociedade, pois os dons naturais são complementares.
Ocorre que nessas duas situações, existem outras contingências, como por
exemplo, o naturalismo biológico de Píndaro que defendia o Governo dos mais
fortes. Todavia, Platão contra-argumenta com o Governo dos mais sábios,
afirmando que os ignorantes lhes seguirão. Assim, resta que desse conflito
natural há evidente possibilidade de a sociedade e o indivíduo se degenerarem.
Surge a tese da convenção e da república, o consenso mútuo, uma soberania
verdadeiramente natural. Mas Platão refuta os corpos e só a alma é que existe
por natureza, sendo que a alma é anterior a própria natureza ou criadora dela e daí a ordem e a lei devem existir por natureza, pois vem da alma
e assim é o idealismo de Platão no seu Estado. Portanto, teríamos nos moldes de
Platão um Estado Puro, composto de “ordem e lei” que nasce da alma, um Estado
politicamente perfeito, sem intercorrências de ordem econômicas ou materiais imbricadas no Estado, pois a ordem e segurança são ou incidem sobre as coisas, que se encontram no mundo inteligível e pertencentes
aos indivíduos e sociedade que em eventual conflito afetaria a liberdade deles.
Então, deduzo que neste enfoque platônico o Estado tem o papel de intervir apenas nas liberdades negativas (as proibições).
Mas com o surgimento do Estado contemporâneo,
neste raciocínio que coloco, deixou de ser Puro, pois o Estado trouxe para si
(incorporou) muitos elementos de ordem material/substancial, tais como direitos
e liberdades positivas, coisas, serviços como pontes, estradas, educação, saúde, tutela de pessoas, deixando de ser
apenas um Estado da Ordem e Lei do mundo inteligível.
Resgatando o que até aqui expus: No Estado
puro, a luta era contra a degeneração dos indivíduos e da sociedade como papel
primordial. Já no Estado contemporâneo aboliu-se o Estado Puro, o do espírito das
leis (as coisas da alma), para adentrar no mundo substancial das coisas
materiais, fornecendo bens, serviços, intervindo, regulando e os distribuindo.
Todavia as coisas são corruptíveis, pois a matéria se degenera. E o Estado que
primeiramente tinha a função da ordem e da lei “um ideal”, doravante deve ter a
função de combater os elementos corruptíveis em outros níveis, ou seja, no
indivíduo na sociedade e no próprio seio do Estado que deixou de ser Puro e não
responde mais somente pela ordem e lei, mas pelas coisas em geral que é capaz
de fornecer e regular, negativamente na proibição, como principalmente positivamente na concessão de direitos. E todas as coisas são materialmente corruptíveis, como já afirmei
em outros textos, tudo muda... Por esse motivo, o povo e sociedade que eram corruptíveis
por natureza e agora também o são de modo qualificado no Estado. Assim, hodiernamente
passam a se preocupar com o próprio "Estado" emquanto governo corruptível, quando deveria ser ele (o Estado) a via da pureza (ideal) em dar uma forma
de “habitat social adequado” ao indivíduo inserido na sociedade, pois
primeiramente sem o Estado o indivíduo e sociedade podiam se degenerar e se
corromper naturalmente. Portanto, agora o Estado não responde apenas pela ordem e
pela lei sobre o indivíduo e sociedade, mas também sobre si mesmo. Por esse
motivo temos um tripé entre, povo, sociedade e doravante incluindo o Estado
corruptível por natureza, pois as coisas materiais (bens e serviços por ele fornecido) assim são e permanecerão por
todo o tempo vindouro. Em não havendo mais um Estado Puro, a única forma de
preservar ou resgatar a pureza é a mútua vigília: do Estado sobre o individuo e
sociedade e estes (indivíduo e sociedade) sobre o Estado através de uma
dura vigilância incluindo todos os Poderes, competências, funções, bens, serviços,
lei e ordem.... Somente assim, nós cidadãos tornaremos esse complexo de coisas –
Visível e Legível em todos os
pontos. Quem sabe, resgatando a Pureza Perdida.
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira
(Obs. texto sujeito a possíveis correções)
Referente:
-
Karl R. Popper, A sociedade democrática e seus inimigos. Ed. Itatiaia. B.
Horizonte. 1959. (p. 8-94)