sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

Liberdade do Saber - o Discurso, a Sistematicidade Descontínua.

Não entendo a linguagem/discurso de muitas profissões. Resultam em dificuldades na prática da atividade profissional, especialmente quando a tarefa desempenhada vier a exigir pluralidade de intervenções técnicas científicas, mediante atuação de saberes convergentes e sistematizado, necessários na obtenção de resultados.
 No tocante a história do saber, até então a humanidade teve um sistema de exclusão no que tange ao deslocamento da escolha da verdade bem definida, desde a época sofistica, após com Sócrates, Platão, Aristóteles..., onde se ordenou o que seria discurso verdadeiro e falso. Depois de um grande obscurantismo, surgiu do século XVI para o XVII, primeiro na Inglaterra, uma ciência do olhar, da observação, da verificação, uma filosofia natural, o empirismo, que fez surgir novas estruturas políticas, religiosa..., como nova forma de saber. Já no século XIX o aparecimento da ideologia positivista, com pretensão científica no discurso médico, psiquiátrico, sociológico, assim como os discursos prescritivos no sistema penal. Como exemplo, a medicina com intensa ritualização num jogo de limitações, exclusões e de interdições de linguagem especialmente ao mundo exterior.
Foucault afirmou: “Todo sistema de educação é uma maneira política de manter ou de modificar a apropriação dos discursos, com saberes e os poderes que eles trazem consigo”.
De um modo geral, o discurso que atua no interior dos sistemas complexos é constituído por um grupo de restrições, o ritual, que define a qualificação que devem possuir os indivíduos que falam, no jogo de um diálogo, da interrogação, da recitação, e que devem ocupar determinada posição e também formular algum tipo de enunciado. Os discursos religiosos, jurídicos/judiciários, terapêuticos, políticos..., não podem ser dissociados da prática ritual construída para os sujeitos que falam, com propriedades singulares e papéis preestabelecidos.
Na verdade as séries discursivas derivam de uma série de acontecimentos e fenômenos de que estão ligados com esse jogo de noções.
Porém o acontecimento não é da ordem dos corpos (só matéria), mas também não somente o imaterial (ideias), pois, acidentes ou variáveis podem interceder. Assim, nem substância nem acidente, todavia, é sempre no âmbito da materialidade que ele se efetiva. Portanto, não é o ato nem a propriedade de um corpo simples ou complexo que trará a eficácia do resultado, mas um plexo de atuações e intervenções que devem interagir. Nessa linha, a liberdade do saber ganharia um paradoxo: o de um materialismo do incorporal (matéria e idéias associadas), ante um saber sistematizado e homogêneo!
Contudo, os acontecimentos discursivos devem ser tratados como séries homogêneas, mas descontínuas, pois certamente há cesuras que rompem o instante e dispersam o sujeito numa pluralidade de posições e funções possíveis, ficando os sujeitos da relação dispersos.  Imaginamos numa série regular e distinta, qual seria a conexão? Poderíamos colocar em série, ainda que distintas, a medicina com a engenharia sanitária. Essa conexão formaria uma sistematicidade descontínua, uma vez que não excluiria a ritualização da palavra em cada uma dessas corporações de saberes nem criaria interdições, supressões, ou fronteiras e limites de modo que a desordem do discurso entre as linhas de saberes fossem organizadas, restituindo ao discurso seu caráter de acontecimento, afastando ou suspendendo assim a soberania do significante isolado. Disso, poderia haver em determinadas instâncias, portanto, a partilha do discurso sem a presença de enunciados prescritivos e inassimiláveis, produzindo uma homogeneidade, ainda que transitória. Na verdade a doutrina liga/conecta os indivíduos a certos tipos de enunciação e lhes proíbem, conseqüentemente, todos os outros. No entanto, em certos tipos de enunciação, a propositiva, serve para ligar indivíduos entre si e diferenciá-los de todos os outros. Também percebemos uma dupla sujeição: dos sujeitos que falam aos discursos e dos discursos ao grupo.
Revemos acima, o que disse Foucault sobre a imposição feita pelo sistema de ensino que estabelece uma forma política de manter ou modificar a apropriação dos discursos, com os saberes e poderes que eles trazem. Nas instituições e profissões há uma ritualização de ingresso, permanência e saída, com apropriação de discursos por certas categorias de sujeitos. Adotam como lei uma racionalidade imanente, propondo uma verdade ideal. Estabelece linguagem sobre a linguagem - uma metalinguagem (mas aqui não adentrarei na semiótica). Assim, seria oportuno repensar esse relacionamento ritualístico dos ofícios e seus discursos, com instâncias propositivas de inter-relação homogenias ainda que de transição. Talvez agora fosse a vez de uma teoria que faz pensar as relações do acaso e do pensamento. Portanto, propor um projeto crítico para análise das instâncias de controle do discurso, analisando o processo de rarefação como também de reagrupamento e de unificação dos discursos. Contudo, deve sempre levar em conta os limites que interferem nas formações reais, seja de perspectiva como de delimitação, devem também ser levadas em conta conforme as pluralidades de séries nas quais interfiram nos interditos e que sejam diferentes para cada uma dessas séries de acontecimentos sobre os quais se fixam rituais. Repito: qual a solução?  Seria um Platonismo/idealismo substancial!? Um materialismo do incorporal?! Para que haja um novo olhar que possibilite as ideias e matéria/substância mais homogêneas entre os sujeitos ativo e passivo dos discursos, enquanto resultado da reelaboração das disciplinas e seus discursos, orientando o sistema de educação e seu papel de formador. Sem a existência de rupturas significativas ou cesuras dos respectivos rituais nas (e entre) profissões e usuários desses agentes de saberes. (bobagem..., isso já vem sendo feito, às vezes mais rápido ou na forma mais lenta, e é uma eterna construção!).

Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

Um comentário:

  1. Vejo um tema provocador de encantamento. No tocante ao discurso a sua mudança ou deslocamento temporal da verdade na história da humanidade. Procurei demonstrar que a escola produz um sistema de exclusão, formulando um discurso do poder através de ritos disciplinares, e que são propositadamente inassimiláveis, num jogo de limitações semânticas, dificultando a interação com os indivíduos passivos da relação.

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