sexta-feira, 26 de agosto de 2016

A Corrupção Intelectual – A Língua e a Política

Então, parece que nada existe antes mim que não seja melhor, pois estamos degenerando.  Contudo, surge a Política, o período eleitoral em curso. Estas vidas de línguas, mas de cérebro estreito contradizem meus pensamentos, pois falam que o universal se encontra no Estado, até minha moral posso lá encontrar. Destroem a existência presente e a que passou. Apresentam idéias perfeitas, dizendo que a culpa foi do fluxo, pois antes das coisas em fluxo tudo era melhor, todavia o movimento do fluxo se direcionou rumo à decadência. Mas eles vêm combater esse destino Platônico, propondo um novo rumo Aristotélico de que as idéias e ou as essências estão nas coisas em fluxo e que farão mudanças ante a assunção da Chefia do Estado. Elevarão os bens através do progresso (devir), pois com eles as essências se desenvolverão em direção a uma causa final realizante e auto realizada em si mesma. Portanto, apostando na Estabilidade das coisas em fluxo, pois esse fluxo com a intervenção deles terá etapas que se aproximarão cada vez mais da perfeição e nunca mais será decadente! Então não preciso mais me preocupar com minha individualidade. No entanto, trata-se de um período (político) de maldita fertilidade que proliferam vidas de línguas, e cada argumento político tem um contra-argumento para enfeitiçar o público eleitor sem colocar um paradeiro nessa metafísica das línguas, cuja sonorização, como meio, não necessita de argumentos racionais diante de cérebros estreitos. Isso me causa uma corrupção intelectual e “só sei que nada sei”. Sempre revivem a antiga dialética ao argumento de contradições e antinomias, buscando uma síntese no verdadeiro mundo Socrático da parição. Mas antes disso voltamos a uma antiga controvérsia, ou seja, se a razão está no individuo ou no produto do grupo social e do seu desenvolvimento histórico. Assim, nos cérebros estreitos, as idéias, a realidade, as coisas, as essências..., ficam sem identidade, contidas no mundo da fantasia desses receptores, que passam a cultuar dogmas de apenas “estar numa posição”, já deliberada. E ficamos apenas no mundo acidental do acerto ou esperando que os bons insumos/substratos e contingências facilitem nossa sorte. Sim, é este o verdadeiro mundo da Política, porém, necessário para podermos intervir nesse contaminado campo das línguas, apenas sonorizadas.

Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

domingo, 21 de agosto de 2016

O Voto nas Constituições Brasileiras - do Império até a de 1988

(Obs. este texto foi elaborado no ano 2000, portanto, não atualizado)
Diante da proximidade das eleições municipais é sempre bom contar a história do voto. Mas a reflexão que deixo para os especialistas centra-se na opção do voto obrigatório ou facultativo. Disso decorre, ante a conseqüente implicação da liberdade de votar, na perda substancial da participação do cidadão no processo eleitoral, assim como a intensificação do adestramento ideológico (doutrinação e fanatismos) ou na imposição econômica sobre a legitimidade das urnas! Mas o voto seria então um dever, uma obrigação, um direito, uma função publica, dever cívico ou moral? Não sei...
Talvez devesse ser facultativo, mas com a ampliação dos mecanismos de retirada dos maus políticos do poder antes de completar o mandato através de impeachment, recall... Ações políticas-cidadãs por iniciativa popular de x% dos eleitores, em relação ao voto recebido pelo mandatário eleito, apreciado nas casas legislativas com um quorum de 60% dos votos nas duas casas, no caso federal.
                   Antes de adentrarmos efetivamente nos preceitos constitucionais, importante termos em mente alguns enfoques necessários sobre o tema.
                    O Voto integra o gênero dos direitos políticos, trata-se da capacidade eleitoral ativa, como meio necessário ao exercício da soberania popular. Liga-se, assim, à cidadania a qual por sua vez é um atributo político decorrente do direito de participar no governo, cujo núcleo fundamental consubstancia no direito de votar e ser votado. O direito ao voto depende de certas condições estabelecidas no direito positivo: ser brasileiro nato ou naturalizado de qualquer sexo; ser maior de 16 anos; não estar privado temporária ou definitivamente dos direitos políticos; não ser recruta ou durante o serviço militar obrigatório. Inicialmente vale alertar que a interpretação do direito eleitoral tem como regra geral a de assegurar a plenitude dos direitos políticos, sendo a privação ou restrição uma exceção. É esse confronto axiológico que devemos ter em mente.
       Voto ou sufrágio - O sufrágio é universal e o voto é direto secreto e tem valor igual. O sufrágio deve ser entendido como expressão de capacidade eleitoral ativa, e também a passiva, enquanto direito de votar e ser votado. É a aptidão de votar. O voto é o meio pelo qual o cidadão exerce o seu direito de sufrágio. (Melo Filho: p.309). Se exercita o voto também no plebiscito e referendum.
                   A idéia do autogoverno - (do povo) passou às fases da força física para o sorteio, sucessão hereditária e finalmente o de eleição, então como direito.
                   Quanto a extensão do sufrágio: a) universal, b) restrito: censitário e capacitário. Quanto a igualdade: c) igual, d) desigual: plural, múltiplo, familiar.
                   O sufrágio universal se apoia na identidade entre governantes e governados tanto mais real quanto mais amplo aos integrantes da nacionalidade, o art. 14 da CF/88 coincide a capacidade de eleitor com a nacionalidade somado a idade e capacidade. Obedece a uma forma porque é preciso alistar-se, sem restrições de condições de nascimento (nobre, plebeu etc.), fortuna ou capacidade especial.
                   O sufrágio restrito - só conferido a indivíduos qualificados por condições econômicas ou de capacidade especiais. Dividindo-se em sufrágio censitário e capacitário. O censitário concede-se apenas ao indivíduo que preencha determinada qualificação econômica: posse de bens imóveis, de determinada renda ou pagamento de impostos. Por exemplo, no império estavam excluídos de votar nas eleições para Deputados e Senadores os que não tivessem renda liquida anual de duzentos mil réis por bens de raiz. As constituições de 1891 (art. 70, § 1º item 1º) e de 1934 (art. 108, parágrafo único), excluíam os mendigos do direito de sufrágio. E mais, o voto censitário tinha raízes no racionalismo de Jhon Locke onde se argumentava que a classe trabalhadora era incapaz de ter uma vida plenamente racional.
                   O sufrágio capacitário, baseia-se em capacitações especiais, notadamente na natureza intelectual - certo grau de instrução, que seja alfabetizado. Eliminado na EC 25/85, confirmado na CF/88 que conferiu o direito aos analfabetos. Trata-se de um direito decorrente da nacionalidade e seu exercício subordina-se as condições mínimas de capacidade, liberdade e dignidade pessoal - um direito público subjetivo democrático de soberania popular.
                   Sufrágio igual - cada eleitor disponha de número igual de votos dos demais, a isonomia, a cada homem, a cada eleitor, um único voto, cada cidadão o mesmo peso político.
                   Adota-se o voto feminino na CF de 1934.
                   O voto é, pois, distinto do sufrágio, este é direito político fundamental nas democracias política. Aquele emana desse direito, no plano prático voto é o ato político que materializa na prática o direito público subjetivo de sufrágio, contém decisão de poder.
                   Voto não é uma função. É sim uma função pública, mas da soberania popular, traduz o instrumento de atuação desta. Assim, uma função social, que justifica sua imposição como um dever.  Considera-se, portanto, o voto não o simples depósito da cédula na urna, mas a efetiva escolha. O chamado voto em branco não é voto, apenas o cumprimento de um dever jurídico e não o dever social e político.  Atributos de personalidade devem estar presentes e ele próprio votar (sem mandato); liberdade faculdade de escolher o representante, depositar a cédula mesmo que em branco ou anular.
                   A lógica da igualdade pelos liberais, impulsiona a idéia do sufrágio universal, mas o sufrágio universal haveria de resultar o fim do Estado liberal, pois cria-se partidos de massa. Daí os legisladores da Revolução Francesa foram contraditórios, pois ao mesmo tempo em que sustentavam a igualdade de todos, admitiam que a sociedade devesse ser dirigida pelos mais sensatos, mais inteligentes, a elite social, onde se adotou o critério econômico e o intelectual, com o sufrágio restrito. É bem verdade que se constitui em avanço com a eliminação dos privilégios da nobreza.  (Dallari: p.156).
            Segundo Canotilho, na teoria do Direito Eleitoral e soberania nacional, o voto não é um direito mas uma função (teoria-do-eletorado-função) ao contrário na teoria Rousseauniana reconhece o direito pessoal (teoria do eleitorado direito) (Canotilho p.260).
                   Aqui fizemos um corte para refletir: se o sistema representativo tem traços nitidamente políticos e não jurídico, pode se concluir que o mandatário é um fiduciário  e não um delegado do eleitor, pois representa os interesses gerais, políticos (Bobbio: p.46-47)
                   O Brasil tem na sua história sete Constituições, uma no período monárquico e seis no republicano. As mudanças constitucionais, em geral, ocorrem no contexto de importantes mudanças sociais e políticas do país.
Constituição de 1824 – Eleições indiretas e censitárias, com o voto restrito aos homens livres e proprietários e condicionado ao seu nível de renda.
Constituição de 1891 – O voto é universal e não-secreto para homens acima de 21 anos, vetado às mulheres, aos analfabetos, soldados e religiosos.
Constituição de 1934 – Institui o voto obrigatório e secreto e estende o direito de voto às mulheres. Prevê a criação da Justiça Eleitoral.
Constituição de 1937- não há alterações eleitorais apenas Estabelece eleição indireta para presidente da República, com mandato de seis anos.
Constituição de 1946 – também não apresenta novidades na capacidade eleitoral ativa.
Constituição de 1967 –  do mesmo modo que a anterior não apresenta novidades.
Constituição de 1988 –. O direito de voto é estendido aos analfabetos e aos maiores de 16 anos.

                   Referências Bibliográficas

BOBBIO, Norberto. O Futuro da Democracia: uma defesa das regras do jogo/Norberto Bobbio; tradução de Marco Aurélio Nogueira. Rio de janeiro: Paz e Terra , 1986.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado: 19º ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do Processo Legislativo. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 1995.
MELO FILHO, José Celso de. Constituição Federal Anotada: São Paulo. Saravia, 1984.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, São Paulo,    Malheiros, 1995.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

O Ócio

Na véspera de completar um ano de aposentado, entendo a defesa de Aristóteles em dizer que “o primeiro princípio de toda a ação é o ócio”. Ou seja, para estar no ócio da minha aposentadoria teve uma causa, o trabalho. Continuo a raciocinar: Claro que entre a potência e ato encontra-se a ação (o trabalho ou negócio) – mas disso já falei e aqui apenas me interessa escrever sobre o ócio. Então minha causa final é o ócio. Sim, meu corpo físico tende ao ócio. Obviamente, ignoro a máxima de Platão de que toda a mudança é degeneração, uma vez que devia me conservar como o original, ou seja, “a forma ou ideia perfeita”, mas essa ideia platônica não está no mundo físico.  No entanto, aqui no mundo físico, ao me desenvolver, alterei a semelhança com esse arquétipo original. Assim sendo, o bem não pode estar apenas no ponto de partida, no original, como quer Platão nesse raciocínio, mas na causa final do movimento, “o que vier a ser”. No caso, uma ação ao ócio, no meu propósito. Sim, mas os corpos físicos mesmo diante da ação, também procuram como causa final um lugar natural para o repouso: (K. P. 228) o peso dos corpos grave quando lançados, tal como a pedra, busca a terra. O ar e o fogo, enquanto corpos leves objetivam elevar-se, lutando para ocupar a justa posição do descanso/repouso na ordem da natureza, pois o lugar das pedras é repousar na terra, o do fogo e ar em lutar para alcançar os corpos celestes na justa ordem da natureza. Os corpos sensíveis assim também lutam: Veja o Cervo aprisionado ao escapar corre em direção a floresta numa tendência em voltar ao habitat natural, local do seu justo repouso. Mas tudo o que posso afirmar não tem sentido se não fizer uma defesa, distinguindo entre conhecimento e opinião. Mas daí também deverei distinguir entre conhecimento demonstrativo do intuitivo. Aquele (demonstrativo), enquanto apreensão das causas que podem ser demonstradas. Este (intuitivo) a apreensão pelas premissas básicas que descreve a essência de uma coisa pelo termo definido ante a fórmula definidora enquanto descrição da coisa, ou seja, o termo definido no exemplo “vaca” deriva de uma formula definidora enquanto descrição da coisa, sendo um Ser sensível pertencente ao gênero animal, capaz de gestar outro “Ser - bezerro” da mesma espécie e produzir leite, deambulando sobre quatro patas, alimentando-se de vegetais e que pode ser adestrado... Assim, o método intuitivo, através de premissas é mais adequado para a ciência. Todavia, como ser que não me contento apenas com o sensível, mesmo agora estando nele, mas refletir sobre tal. Então me satisfaço em provar meu ócio pelo método demonstrativo causal, de que nos tempos recuados vivia do labor, seja do negócio/trabalho: “...negócios para promover o ócio” (Aristóteles, Política, p. 258), pois é mais fácil comprovar meu passado (tempo de serviço) como causa da ociosidade. De outro modo, meu tempo natural de repouso que ora me encontro, desfrutando mais do  mundo sensível,  não pode ser utilizado nem revogado por qualquer outro método que não seja apenas a última causa da extinção da pessoa natural, dando fim ao ócio e ao mesmo instante ao tempo. Mas então, todo o ócio merecido deve ser usufruído, ante uma vida boa (eu zen – p.15)!
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

(Obs. texto sujeito a modificações) 

quinta-feira, 11 de agosto de 2016

Juristas e Tiranos

Neste dia do Advogado, profissão que exerci desde 28/03/1985 e ainda estou autorizado a exercer, registro que hoje nada escreverei, pois é minha folga para comemorar! No entanto, transcrevo um texto que retirei do meu dicionário jurídico.
Chamo a atenção aos Colegas da AGU- Advocacia-Geral da União para que reflitam sobre a atuação dos membros dessa relevante e essencial função Constitucional:
“Juristas e Tiranos. Não há talvez profissão cujos membros hajam escrito mais a respeito dela mesma ou deles próprios do que a Advocacia. E isto se explica facilmente se considerarmos que o advogado sempre esteve ligado à vida política e tomou parte em grandes acontecimentos históricos em todas as épocas e países. Mas deduzir daí que ele sempre foi um defensor da liberdade ou da democracia, é completamente errado. Está concepção pertence a uma visão romântica da Advocacia, que infelizmente hoje vai desaparecendo para dar lugar a uma conceituação do advogado como defensor de interesses. Historicamente, o advogado ou o jurista sempre foi defensor tanto da Liberdade como da Tirania. Tanto os regimes Democráticos como as tiranias políticas sempre contaram com o jurista para emoldurar o regime. Tocqueville em página magistral dos seus "Fragmentos Históricos Sobre a Revolução Francesa" já notara que o jurista dá ao déspota um sistema para sua vontade arbitrária, um sabor de método e Ciência para o governo, e que onde as duas forças se cruzam, aparece um irrespirável despotismo. Diz mais ainda que quem conhece o príncipe sem o jurista que está por trás só conhece uma parte da tirania. Não há nada de surpreendente neste fato, se considerarmos que o jurista pertence a uma determinada classe cujos interesses defende Consciente ou  inconscientemente como qualquer  outro membro desta Classe, e que por formação é um elemento conservador, avesso a mudanças e com uma concepção legalista da vida social, uma concepção de caráter formal. Mas, poder-se-á objetar, houve Juristas que defenderam interesses contrários aos da classe a que pertenciam, que protestaram contra toda violência ou ilegalidade, que  lutaram contra todos os regimes de Tirania. Mas esses sempre foram a  minoria, exceção que confirma a regra, e por isto mesmo grandes democratas cujo nome a historia guardou, porque a grande maioria adere ou se cala, conformando-se em reconhecer o poder por ser poder, partindo dai para diante. De forma que Continuar dizendo que o jurista é por definição um partidário da liberdade não passa de hipocrisia ou desconhecimento dos fatos. Nossa época não admite mais uma mística do jurista sob a máscara do direito. O que vale é o homem, é ele que ilustra a profissão que escolheu.” (Enciclopédia do Advogado, Editora Rio 3ª ed, p. 211).

Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

sábado, 6 de agosto de 2016

A Separação entre Fazer e Querer – a Vontade

O Crítico Schopenhauer disse: “O Homem Pode Fazer o que Quer, Mas Não Pode Querer o que Quer”.
Evidentemente que eu poderei fazer o que quiser, salvo as consequências que alguns fatos me trarão!
Neste texto façamos um destaque da vontade. Então, nada mais real do que o vontade?! O pensador coloca a vontade geral no sentido do irracional enquanto instinto de conservação, mas que também se apresenta como fonte do nosso sofrimento no momento em que o desejo da vontade não realizado sempre causa sofrimento. E para ele a vontade é uma representação da realidade, pois o objeto é o que queremos que seja.
Contudo, não poderei "querer o que quer", uma vez que tal propósito encontra-se no âmbito dos desejos, da ambição, e está ainda no  apetite sensitivo que pode estar fora de mim, havendo resistências externas ao querer, e eu não saberia dizer se a realidade é sempre contingente (causal) da vontade. Bem, daí em diante adentraria no campo de outras ciências, a psicologia, psicanálise, linguística..., por exemplo.
Disse Schopenhauer::
"Quanto mais claro é o conhecimento do homem – quanto mais inteligente ele é – mais sofrimento ele tem; o homem que é dotado de gênio sofre mais do que todos.”
Sim, sofre mais, pois a vontade fica delimitada pela reflexão, ou seja, quanto mais irracional a vontade, menor o sofrimento pois há mais realizações da vontade geral no plano irracional. Quanto mais delimitada a vontade pela inteligencia/reflexão, maior o sofrimento por não poder realizar essa vontade geral.
“...e completamente cientes de que aqui cada um é punido por sua existência, e cada um a seu modo”  P. 124. (Arthur Schopenhauer. Da Morte, Metafísica do Amor, Do sofrimento do Mundo.)
Perfeito Schopenhauer, mas eu adentro um pouco no existencialismo para  sair do seu pessimismo enquanto supremacia da vontade para falar da igualdade, hoje em voga: Digo que a igualdade deve ir no mínimo até o ato de existir por existir. Desse modo concordo que desejamos ser punidos pelo menos cada um de acordo com a sua existência, e assim na simples existência somos todos iguais, e a lei natural e convencional deve preservar essa primeira medida. Todavia, a diferença começa a seu modo e de acordo com a essência que conseguirmos. Daí, preferimos ser acalentados ou punidos na medida da existência somado nossas essências como atenuantes para que possamos ter a dose certa de sofrimento ou dele se livrar. Mas vejo que o gênio fixou essência, e por isso terá a devida atenuante seja no campo do fazer, pois fez o que quis de forma condicionada, reflexiva, ainda que sofra mais na esfera do querer ao perceber que suprimiu sua vontade geral e irracional enquanto incondicionado e que poderia ter lhe trazido mais prazer. (Obs. o incondicionado muitas vezes me refiro como razão transcendental, mas aqui limito essa palavra enquanto apropriada pelo signo de irracional).
Schopenhauer no seu raciocínio diz que o caminho da libertação do sofrimento está em viver um mundo mais estético e  contemplativo, consciente da existência de uma vontade irracional, podendo numa etapa seguinte levar ao desapego material numa purificação ascética, suprimindo ou desprezando a própria vontade...
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

(texto sujeito a alterações) 

domingo, 31 de julho de 2016

O Todo

A expressão “O Todo” que abusivamente adoto, tornou-se meu dogma linguístico. Portanto, tenho que explicar, ainda que para mim mesmo.
Não tenho razão de me prender nisso, pois para alguns seria um holismo ou mesmo coletivismo de há muito adotado, seja considerando o universo, a cidade, a tribo ou outro corpo coletivo como tal. Porém, em qualquer destas situações sempre existirão partes ainda que inexista a liberdade individual. Já havia mencionado a referida linguagem onde me referi que "A parte existe em função do todo, mas o todo não existe em função da parte.” Citando um exemplo disso no texto Tudo é Valor e Não Valor: “Mas o oceano sobrevive sem a baleia, no entanto a baleia não vive sem o oceano, uma vez que ela é apenas contingente. O valor e não valor sobrevive sem o direito, mas o direito não sobrevive sem os valores por ser contingente deles (vide o efeito sombra do direito).”
http://utquid.blogspot.com.br/.../tudo-e-valor-e-nao.... 
Outros poderiam até dizer que o egoísmo está na parte e o altruísmo no coletivo. Numa fria análise, diria que a parte jamais seria emancipada do todo. Não poderíamos tratar a baleia senão o oceano para curar as baleias. Não poderíamos curar o indivíduo, senão apenas combater as epidemias, endemias e pandemias. Não poderíamos punir o indivíduo senão em sanear a sociedade. Levado ao extremo, eu passaria a amar apenas minha tribo e não ao próximo, não havendo mais privado ou individual. Dessa maneira eu seria condicionado ao todo e jamais me emanciparia pelo incondicionado, seria um elemento causal de “o todo”. Não nego que a ideia do todo tem muito sentido e é exemplarmente aplicada nas funções que exigem disciplina e ordem e as partes integram e se submetendo ao todo. Vejamos então que "o todo" no
totalitarismo tem sucesso na esfera militar em que a disciplina está acima de tudo mesmo na paz, passando a vida inteira numa total mobilização. Mas “o todo” pode considerar o indivíduo como um contingente, enveredando pelo caminho em direção do totalitarismo político, sacrificando até mesmo a ética, uma vez que a ética e moral nesse viés será um critério ou interesse do Estado, do todo e não do indivíduo. Então numa república a ideia de o todo pode ser totalitária enquanto regime político, cuja liberdade se pratica apenas pela submissão ao todo, quando em harmonia com o Estado, ou melhor, de acordo com seu líder. O indivíduo está num nível inferior de valor e o Estado não se ajusta às reivindicações dos indivíduos enquanto partes. Mas a totalidade pode estar no grupo ou na tribo a que pertenço e a ética passa a ser ditada pelo grupo ou tribo, daí desaparece a virtude individual e cada um deve adaptar-se ao seu lugar certo, não devendo se afastar. A justiça passa ser universal ou comum do ponto de vista da moralidade totalitária e diria  que de certo modo baseada numa forma jusnaturalista fundada em princípios gerais, desde que satisfizesse ao interesse geral de liderança. Então a estabilidade está no todo e não nas partes. E o racionalismo deixa de ser individual para ser de liderança por um egoísmo coletivo, ou de consciência coletiva, superando a razão.
Vejamos que as teorias de responsabilidade do estado mudariam, pois a responsabilidade civil do Estado vista hoje sob o enfoque de três teorias: a teoria da culpa administrativa, a teoria do risco administrativo e a teoria do risco integral. Mas se adotarmos uma visão totalitária, a posição defensável por mais adequada seria a da inexistência de indenização, uma vez que o todo não causa prejuízo às partes, ou seja, o totalitarismo se igualaria ao liberalismo dos extremos ou mesmo do absolutismo. Mas num Estado democrático, onde “a parte” tem a liberdade, a responsabilidade civil deve ser vista no mínimo sob o enfoque da teoria subjetivista, inclusive a do Estado, uma vez que somos responsáveis pela escolha dos representantes. Deixo de me aprofundar nessa questão, mas abrindo apenas um viés para que pensamentos filosóficos possam ser pesquisados nesse sentido (em especial o da responsabilidade do Estado). Aqui apenas quero chamar a atenção ao tipo de responsabilidade civil seja do Estado ou do Individuo numa sociedade fechada decorrente de uma consciência coletiva (que se aproxima da sociedade absolutista) que se diferencia da outra sociedade aberta em que os indivíduos são confrontados com decisões pessoais que chamaremos de Sociedade Democrática.
Se adentrasse no âmbito da religião falaria apenas de maneira leiga e diria que “o todo” seria qualificado como uma forma de egoísmo divino, mas que para nós após a dita expulsão do paraíso deixou de existir. Então Deus no primeiro momento da criação foi egoísta sim. Afirma a religião que fez apenas uma criatura completa dizendo ser sua imagem e semelhança – “a imagem e semelhança do todo”, pois tudo se resumia na imagem e semelhança, num eterno e inalterado Paraíso. Depois mudou de ideia, fazendo mais um Ser para companhia do criado, e finalmente autorizou a procriação da espécie humana, estabelecendo leis naturais e as convencionais para seguirmos o fluxo da criação, “contribuindo e usufruindo”. E ainda para que não fossemos inteiramente egoístas, nos tornou perecível enquanto indivíduo, porém imperecível na espécie pela procriação: nascer, viver e perecer num eterno ciclo, motivo pelo qual pudéssemos através de escolhas, as pessoas viverem em união. Assim, dividiu nossa compreensão do tempo entre eternidade que passou e toda a eternidade vindoura, pois antes a eternidade era única. Ficamos, enquanto indivíduo, no meio dos extremos, com a menor parte desse longo tempo. Por isso, se isolados da espécie seremos sempre um “meio” e nunca um fim em si mesmo! Concedeu-nos apenas milésimos do tempo infinito da criação para passarmos aqui na terra! Muito pouco, por vezes nos faltará tempo para realizar as obras do bem e até mesmo para o arrependimento, pois da criança à velhice não há qualquer eternidade, senão apenas um espaço e o inexorável tempo médio de duração que cabem dentro da memória, porém, contendo um inevitável fim de nossa presença física sobre a terra. Tornou-nos perecíveis! Esgotada essa medida, nos leva o único bem valioso, a vida! E ainda nos fez individualmente egoístas, ao queremos agir mais do que meios, senão seguirmos o inevitável fluxo das leis naturais e convencionais da humanidade! Portanto, somos parte, pois ficamos de fora do todo (eterno) e apenas vivemos em união para o bem do todo. Numa aliança.
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira

(texto sujeito a modificações) 

quinta-feira, 21 de julho de 2016

A Verdade

O oposto da verdade, sendo um dos antônimos, é a mentira, mas procurar a verdade através da mentira seria uma tarefa desmesurada.
Estou convencido que a verdade se encontra distante da imitação, e desta até aquela existe um caminho possível de se conhecer. Então, parece-me que a verdade se difere da imitação!  Claro, a arte de imitar está bem longe da verdade, pois a imitação não passa de uma aparição. Contudo a imitação pode facilmente ludibriar as crianças e os homens ignorantes. Um bom pintor (e o marqueteiro imita o pintor!) pode imitar a figura de um autêntico trabalhador e quem olha de longe ou viu rapidamente, passa a ter a imitação como verdade.
Um charlatão não consegue extremar a ciência que imita. Por isso, não será um médico, senão um imitador da linguagem dos médicos. E assim também fazem os falsos filósofos, imitam a linguagem dos filósofos, mas não conhecem a filosofia, não possuem "amor à sabedoria", tanto no estudo de problemas fundamentais relacionados à existência, ao conhecimento, à verdade, como nos valores morais e estéticos, à mente, à linguagem e a razão. Um falso filósofo vive na doxa (sofista), que é baseado somente na aparência.
Se uma pessoa pudesse fazer o objeto e a perfeita imitação dele pela imagem, possivelmente poria está última aptidão na primeira linha de sua vida. Passaria então a imitar. Mas se fosse conhecedor profundo das coisas que imita teria sua aptidão mais voltada às obras do que a imitação.
Do mesmo modo posso criar objetos e tudo o que existir perto de mim, até onde a luz permitir sem oclusão. Neste caso me utilizo do espelho. No entanto, o que vejo não é verdadeiro, tal como uma pintura, é aparente. Por outro lado se sou proprietário de um automóvel não o tenho como verdadeiro, uma vez que foi apenas executada uma ideia, um projeto, passando a ser semelhante, aparente, um carro qualquer. Ademais, se assim penso, o fabricante do carro faz algo que não é verdadeiro, mas alguma coisa de semelhante ao que existe, e que ao mesmo tempo não existe. Mas o homem só conseguiu fazer o motor por tração (semelhante) e não por atração, enquanto causa final: "Aristóteles fala da passagem da Potência ao Ato e afirmou que deveria haver um primeiro motor. Tudo se move de uma para outra condição e até o universo assim estabelece (Deus como causa final, movimento por atração, o motor imóvel) - http://utquid.blogspot.com.br/2016/02/a-liberdade-esta-entre-potencia-e-ato-o.html"
Então, parece que a Arte de Imitar está distante da realidade e longe da verdade esta enquanto pertencente ao Criador, bem como do Artífice que reproduz, pois o imitador mesmo executando tudo ao que parece, atinge uma pequena porção de cada coisa, que não passa de uma aparição. Platão exemplifica: “Por exemplo, dizemos que o pintor nos pintará um sapateiro, um carpinteiro, e os demais artífices, sem nada conhecer dos respectivos ofícios. Mas nem por isso deixará de ludibriar as crianças e os homens ignorantes, se for bom pintor, desenhando um carpinteiro e mostrando-o de longe com a semelhança, que lhe imprimiu, de um autentico carpinteiro” (pag. 296-97).
Na política há falsos artífices, pois apenas poetas idênticos a Homero, afastados nos três pontos da verdade, uma vez que fazem da Imitação a primeira da suposta virtude da verdade. Não conhecem quais são as atividades que tornam os homens melhores ou piores, na vida pública ou particular. Por isso, imitadores das imagens da virtude e dos restantes assuntos sobre os quais compõem em seus textos e discursos, porém, não atingem a verdade, senão aparências. Mas a arte sobre o objeto está em três pontos: a de utilizá-lo, a de confeccioná-lo e a de imitá-lo. Portanto, o bom político deve ter o completo domínio sobre o objeto de modo a utilizá-lo, confeccioná-lo e de imitá-lo. No que se referem as demais profissões basta se especializar num dos pontos sobre o objeto, sem exceder o seu campo, uma vez que se ao contrário fizesse estaria se distanciando ainda mais da verdade.
Assim sendo, a imitação quando fora do palco, da tragédia em si mesma, se distancia do artífice e da verdade criadora, e devemos lançar mãos à medição, ao cálculo, a pesagem de tal modo a prevalecer sobre a aparência. E essas operações podem ser trabalhadas pela razão que está em nossa alma. (No Ideal).
Milton Luiz Gazaniga de Oliveira
Referente:

Platão. A República. Livro X. Martin Claret, São Paulo, 2004. (pags. 293 segs.)